Da necessidade de melhoria nas políticas públicas de combate à violência doméstica

FABIANO MORAIS DE HOLANDA BELTRÃO

 Promotor de Justiça do Estado de Pernambuco

Resumo: 

Discute-se acerca das legislações infraconstitucionais e das políticas públicas existentes para diminuição da violência contra as mulheres, partindo do ponto de vista que, no Brasil, um só conjunto de leis é insuficiente, sendo imprescindível a efetivação de políticas públicas para suprir as lacunas da realidade e das praticas sociais que se enxergam no dia a dia. Por fim, aborda-se o cenário de violações institucionais a que muitas mulheres estão submetidas por falta de qualificação profissional. Conclui-se que é imprescindível a atuação do Estado no sentido de intervir na redução da violência doméstica e familiar, sendo indispensável à proteção da mulher. Nesse contexto, espera-se que ocorra a conscientização da sociedade brasileira e capacitação dos operadores do direito, para mudar a atual realidade de violações aos direitos das mulheres.

PALAVRAS-CHAVE: Patriarcado; Violência contra mulher; Legislações; Empoderamento feminino. 

1 Introdução

É necessário que se tenha uma visão crítica acerca da eficácia das medidas tomadas pelo Estado brasileiro, em função do alto índice de violência contra as mulheres, para o combate, prevenção e, principalmente, acerca da proteção de suas vítimas, baseando-se na lei Maria da Penha e na lei que institui o feminicídio como cincunstância qualificadora do crime de homicídio (Lei nº 13.104/15).

A violência contra mulher teve, ao longo dos anos, um crescimento acentuado, cujas consequências afetam mulheres de todas as classes sociais e faixas etárias. E isso ocorre em razão das relações de poder, fundadas no patriarcado, que dão mais privilégios aos homens, em detrimento às mulheres.

Desse modo, têm-se a base para o feminicídio. Esse ciclo de violência poderia ser inibido havendo acompanhamento e ajuda primária para rompê-lo. Constata-se a dificuldade para esse rompimento, isso porque há necessidades e dependências das vítimas no que se refere às suas relações emocionais, financeiras e laços familiares.

No Brasil, os feminicídios são casos comuns, cujos algozes são principalmente os parceiros ou ex-parceiros das vítimas. Nota-se que esse tipo de violação fragiliza e até impede a vítima de levar a conhecimento das autoridades os fatos, dada a necessidade em revelar os crimes cometidos por aqueles a quem prometeu amar e conviver. 

Entretanto, a violência contra mulher é tão comum na sociedade que muitas delas têm dificuldade em se reconhecerem como vítimas do ciclo vicioso que lhes impõe uma rotina de violações físicas e emocionais; além de tudo, existem obstáculos para se romper a barreira do silêncio. A solução da problemática passa necessariamente por medidas adotadas pelo Estado brasileiro; contudo, a eficácia dessas medidas é colocada em xeque quando se enxerga o aumento dos números dessa espécie delituosa. 

Portanto, é imperioso se verificar onde o Estado tem errado, como pode melhorar a eficácia das políticas públicas de combate a violência doméstica e o quanto dessa realidade provém de uma questão sociocultural. O certo é que há deficiência na aplicabilidade da legislação infraconstitucional, porque a violência e a mortalidade crescem e vitimam cada vez mais as mulheres.

Assim, temos de um lado a responsabilidade estatal na melhoria da políticas de combate à violência e a necessidade de se alcançar a sonhada equidade entre homens e mulheres. Até porque, a par de tudo que já foi feito, é fato que há um aumento dos números da violência contra a mulher.

O fenômeno social da violência de gênero tem expressiva relevância jurídica e social, sendo fundamental considerar a categoria de gênero que advém de uma sociedade patriarcal. É um problema complexo, devastador e, simultaneamente, algo comum. Soma-se a isso a violação dos direitos humanos. A partir daí, fazem-se necessárias algumas demandas de elaborações e efetivas medidas em prol da prevenção e apoio às vítimas, podendo elas serem tanto públicas quanto privadas.

É imprescindível ressaltar que há a violação dos direitos humanos, posto que a ineficiência das políticas de proteção às mulheres lhes afeta a saúde e integridade física.

Desse modo, foi sancionada a lei nº 11.340/06, Lei Maria da Penha, que cria meios de coibir e prevenir a violência contra as mulheres. Após alguns anos, tem-se a lei nº 13.104/15, que institui o feminicídio, com o intuito de inibir o assassinato das mulheres pela criação de uma qualificadora específica para quando o crime for motivado pelo gênero feminino da vítima. Apesar do avanço dessas legislações, atualmente ainda nos deparamos com a cruel realidade dessa violência, na qual o Brasil ocupa posições alarmantes, quando se comparam os números aqui em relação a outros países, uma vez que somos o 5° país com o mais alto índice de feminicídios.

Para entender melhor como acontece a violência contra a mulher no Brasil, é necessário ter em mente a construção histórica da dominação/subordinação caracterizadora da forma como as relações sociais nasceram no país, em seu período colonial, sedimentado no período imperial e continuado, ainda, quando o país se “modernizou” para uma república. 

Eis a razão de examinarmos a rede de proteção à mulher, baseando-se na abissal diferença entre o abstrato e o concreto. Apresentando críticas sobre as leis e as políticas públicas de combate à violência contra a mulher, com base nos números alarmantes da violência. Por fim, relatamos as violações institucionais sofridas pelas mulheres, trazendo perspectivas de uma maior proteção às vítimas.

Assim, é necessário discutir como a sociedade ainda lida com esse cenário contínuo de violações aos direitos das mulheres, tendo como principal foco a análise dos trabalhos que abordam os temas sobre gênero e violência contra a mulher, levando em consideração a principal consequência que é a violação dos direitos humanos. Por fim, faz-se imprescindível a análise de dados obtidos através do mapa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), destacando o cenário atual com o aumento de violência de gênero.

2 Gênese normativa das leis que protegem a mulher

2.1 Direitos humanos e internacionais das mulheres

Um grande marco para o direito das mulheres foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948, que traz um novo discurso sobre as responsabilidades dos homens e das mulheres. A partir da assinatura desse documento histórico, todos os países signatários assumiram a obrigação de transformar as suas legislações, visto que concordaram em pôr em prática a igualdade dos gêneros, como prevê a declaração, como um direito humano. 

Ainda em 1946, quando se trabalhava na construção da Declaração Universal dos Direitos Humanos, foi criado o Conselho econômico e Social da ONU e a Comissão sobre a Situação da Mulher, que se tornou o primeiro órgão intergovernamental global destinado exclusivamente à igualdade de gênero. O objetivo da Comissão é garantir informação ao conselho sobre provocação dos direitos das mulheres nas áreas política, econômica, social, civil e educacional. Inicia-se, dessa maneira, a se compilar as informações sobre a realidade das mulheres em várias áreas, para que com isso haja o desenvolvimento e construções de políticas públicas. 

Na segunda metade do século XX, após a Segunda Guerra Mundial, ocorre a explosão do movimento feminista, acompanhado dos debates sobre a participação na sociedade e a entrada maciça das mulheres urbanas dentro da área profissional de forma mais organizada. 

No ano de 1975, há a realização da primeira Conferência Mundial da Mulher e, em 18 de dezembro de 1979, a Assembleia Geral da ONU, a partir da pela resolução n.º 34/180, aprova a criação da Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination against Women (CEDAW), ou Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher.

Essa mobilização histórica propiciou uma mobilização mundial em diversos países onde as mulheres lutavam contra a violência, porém ainda não tinham apoios institucionais. O suporte das Nações Unidas foi fundamental para o fortalecimento dessa luta e mobilização conjunta. Com os efeitos dos movimentos feministas, intensifica-se o debate por direitos humanos, sendo introduzido o discurso da igualdade entre homens e mulheres no seio dos países, principalmente daqueles vinculados às Nações Unidas, possibilitando que as mulheres buscassem e consolidassem os seus direitos. 

Os Estados signatários se comprometem a incorporar o princípio da igualdade entre homens e mulheres em seu sistema jurídico, abolir todas as leis discriminatórias e adotar leis adequadas que proíbam a discriminação contra mulher; estabelecer tribunais e outras instituições públicas para garantir a proteção eficaz das mulheres contra a discriminação e assegurar a eliminação de todos os atos discriminatórios contra as mulheres, cometidos por pessoas, organizações ou empresas. 

No Brasil, a convenção foi assinada em 31 de março de 1981, aprovada pelo decreto legislativo n.º 93, de 14/11/83 e ratificada em primeiro de fevereiro de 1984, entrando em vigor em dois de março de 1984 – com ressalvas dos artigos 15, 16 e 29. Todavia, em 1994, as ressalvas apenas dos artigos 15 e 16 foram retiradas e, a partir de 13 de julho de 2002 passou a ser regulada pelo decreto n.º 4377/02, até hoje vigente. 

O direito das mulheres começa a ser pauta cada vez mais em debate sobre os direitos que precisam ser garantidos. Um exemplo pode ser observado em Viena, durante a II Conferência Mundial dos Direitos Humanos, em 1993, que dispõe em seu art. 18 que “os Direitos Humanos das mulheres deverão constituir parte integrante das atividades das Nações Unidas no domínio dos Direitos Humanos, incluindo a promoção de todos os instrumentos de Direitos Humanos relativos às mulheres. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos insta os Governos, as instituições e as organizações intergovernamentais e não governamentais a intensificarem os seus esforços com vista à proteção e à promoção dos Direitos Humanos das mulheres e das meninas”. 

A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, também conhecida como Convenção de Belém do Pará, concluída em Belém do Pará, em 1994, foi inspirada e também inspirou a atuação não só das Organizações dos Estados Americanos, mas também a Organização das Nações Unidas, com a realização da Convenção Mundial dos Direitos Humanos, em 1993. 

A Convenção de Belém do Pará foi promulgada no Brasil pelo decreto presidencial nº 1.973, de 1º de agosto de 1996, com resultados paradigmáticos na consolidação da ideia de serem criadas políticas públicas na defesa do direito da mulher vítima de violência. Caracterizada pelo momento civilizatório, a convenção propiciou o primeiro tratado internacional legalmente vinculante que criminaliza todas as formas de violência contra a mulher – apontando seus autores e indicando o que os Estados integrantes precisam fazer para punir e erradicar essa violência, em especial a violência sexual.

Cumpre enaltecer o papel das feministas e das organizações de defesa dos direitos das mulheres, com intensa atuação em toda a trajetória internacional, a fim de que não houvesse impunidade para as violências ocorridas, como por exemplo: a violência física, psicológica e sexual; violências às quais ocorrem tanto no âmbito da família, comunitário e também perpetrada pelo Estado ou pelos agentes do Estado. 

Segundo o art. 1º da convenção, entende-se como violência contra mulher um universo de condutas que podem ser tipificadas como atos criminosos, não sendo apenas violência física ou sexual, mas também agressão psicológica e emocional.

A Organização dos Estados Americanos (OEA) reconhece que a violência de gênero ocorre tanto no âmbito privado como no público, colocando em discussão a necessidade de prevenir a violência contra mulher ocorrida nos espaços privados. Logo, se faz necessário que o Estado combata a questão e incentive, de igual forma, a sociedade, utilizando-se de políticas públicas contínuas, por meio de campanhas midiáticas e outros artifícios para que esse tipo de violência seja inibido em qualquer âmbito social. Já no âmbito público, há necessidade de se contrapor e evitar que a violência se expresse por meio dos discursos de governantes, cujo teor sexista auxilia, de forma direta ou indireta, a exclusão das mulheres dos espaços de decisão e de poder. 

Dentre as obrigações do Estado está a necessidade de adaptar a legislação de cada Estado-Membro aos stands Internacionais de proteção de Direitos Humanos, respeitando o paradigma civilizatório.

Na convenção do Belém do Pará, por exemplo, foram criadas as obrigações legislativas para os Estados de serviços, de assistências jurídicas para as mulheres e, basicamente, obrigações da informação de seus operadores do direito e de toda sociedade para que a perspectiva de prevenção estivesse presente.

No entanto, até os dias atuais, a perspectiva da punição penal foi a efetivamente realçada na legislação proveniente desses compromissos internacionais, pouco se enxergando a promoção da prevenção e da atenção às mulheres em situação de violência nos aspectos sociais e de atenção à saúde das vítimas, com políticas públicas integradas e harmônicas, que se complementam.

3 Rede de proteção a mulher: a abissal diferença entre o abstrato e o concreto

3.1 As não respeitadas leis de combate à violência contra a mulher e os alarmantes números da violência

A conquista da lei Maria da Penha, e a inclusão da qualificadora objetiva do feminicídio no crime previsto no art. 121 do Código Penal, sem sombra de dúvidas são legislações avançadas. Todavia, apenas a implementação das legislações não foi suficiente para que as vítimas rompessem com o ciclo de violência e que o Brasil saísse da 5ª colocação dentre as nações, sendo o país com maior número de assassinato de mulheres. 

Ao final de 2019, o Brasil apresentava mais de um milhão de casos de violência doméstica e 5.100 feminicídios tramitando na Justiça. Em casos de violência doméstica, houve um crescimento de aproximadamente 10%, sendo recebidos 563,7 mil novos casos. Já os casos de feminicídios que chegaram ao poder judiciário, apresentou aumento de 5% em relação ao ano de 2018. 

Nesse aspecto, não há como deixar de lado a grande responsabilidade do poder judiciário em não dar agilidade aos casos de violência de gênero, sendo notório os problemas envolvendo a execução de medida protetiva, muito em função da falta de estrutura dos órgãos de segurança. 

É fato que esses órgãos carecem de estrutura humana e de tecnologia para monitorar de perto todos os casos que merecem a atenção dos poderes públicos. Portanto, a prática demanda mais programas de proteção para atender às vítimas de violência doméstica. 

Entretanto, sabe-se que existem vários casos de crimes violentos contra as mulheres e o quanto esses casos são recorrentes na sociedade como um todo, a vitimar mulheres, independentemente de sua colocação social.

Havendo a necessidade de que se precisa avançar nos julgamento dos feitos pelo judiciário, para alcançarmos uma tramitação mais rigorosa e célere nos processos em que as mulheres são vítimas de violência doméstica.

No Brasil, com a pandemia Covid-19 se intensificando meados de março de 2020, vários Estados adotaram medidas de isolamento social com o objetivo de reduzir a contaminação da população pelo novo vírus. Independentemente da extrema necessidade e importância, o isolamento acarretou vários efeitos colaterais, colocando mulheres brasileiras em situações de intensificação das violências sofridas em seus ambientes familiares, até por terem sido obrigadas a ficar isoladas com seus agressores, podendo encontrar ainda mais barreiras no acesso às redes de proteção às mulheres e aos canais de denúncia. 

Os números já constatam que houve crescimento dos casos de feminicídios, ou seja, entre março e maio de 2020 se detectou um crescimento de 2,2% nos casos de feminicídios registrados em comparação com o mesmo período de 2019, sendo cerca de 189 casos em 2020, contra 185 casos em 2019. O dados são da plataforma EVA, do Instituto Igarapé,

Isso se não considerarmos o grande número de subnotificações para os casos de violência doméstica e feminicídios, ressaltando-se que em muitos estados o registro oficial de casos de feminicídios, ainda hoje, é caracterizada como homicídio. Ou seja, ainda enfrentamos a dificuldade de conhecimento da realidade, diante da ausência de um padrão nacional de registro das ocorrências, nas quais as vítimas mulheres estão inseridas. 

As não notificações ficam demonstradas quando vislumbramos os números do estado do Rio de Janeiro, no qual houve aumento de feminicídios e tentativas de feminicídio, sendo de 13% a mais de feminicídios em relação ao ano de 2019 e de 23% a mais de tentativas de feminicídios em relação ao primeiro trimestre de 2018. O Espírito Santo mostrou um aumento de 30% de feminicídios em relação ao primeiro trimestre do ano de 2019. Já Minas Gerais não reportou um aumento de feminicídios mas observou-se um aumento no número de tentativas de 13% em relação ao primeiro trimestre de 2019. 

Diante do exposto, nota-se que a lei 11.340/06 e a lei 13.104/15 não atingiram os resultados de forma eficaz para transformar a realidade atual. O Estado ainda não se encontra preparado para proteger integralmente a vida das vítimas que sofrem violência doméstica, por vários fatores, tais como a falta de fiscalização individual das medidas protetivas, baixa infraestrutura de assistência às vítimas, desde a denúncia até o suporte psicossocial para o cumprimento das medidas. 

Todavia, não se trata apenas de um problema legislativo, mas também de atuação da estrutura existente nos órgãos de segurança pública e da Justiça, responsáveis por serem a porta de entrada dos casos de violência doméstica, até pelo recorrente machismo e discriminação contra as mulheres observado pelos agentes públicos integrantes dessas estruturas. Um exemplo o recente é caso do julgamento em que Mariana Ferrer, vítima de um crime de estupro de vulnerável, foi humilhada em audiência judicial, com enredo que se tornou público, dada a forma pela qual foi a vítima exposta em sua intimidade. Em flagrante situação de machismo, o advogado do acusado expôs a imagem daquela jovem influenciadora digital, que de vítima de estupro, passou a ser tratada como culpada pela simples condição de ser mulher e se comportar de uma maneira tida como lasciva pelo patrono do réu. 

Nesse caso exemplar, a sentença absolutória do réu, verdadeiro acusado naquele caso, foi fundamentada em uma inovação jurídica sendo associado ao termo “estupro culposo”. O juiz, assim entendeu por não existir provas suficientes da materialidade do delito, todavia, consta nos autos o laudo pericial que confirmou a prática de conjunção carnal e ruptura himenal recente, ou seja, Mariana, virgem e vítima de conjunção carnal forçada, ainda sim não foi reconhecida como vítima por não ser a conduta do seu algoz considerada intencional, a par das provas existentes nos autos, em clara demonstração de preconceito por parte daqueles operadores do direito.

O funcionamento dos serviços de rede, com sua expansão e interiorização; a criação dos juizados de violência doméstica e familiar, em conjunto com uma equipe de atendimento multidisciplinar competente; a previsão de programas e ações nos planos governamentais; a garantia de recursos orçamentários suficientes para execução do total de recursos alocados e a satisfação das mulheres com os serviços prestados. Estes são desafios a serem enfrentados para que em um futuro haja a redução da prática de violência contra as mulheres.

3.2 As políticas públicas e seu tênue alcance

Só a lei não é suficiente! É imprescindível analisar a ação do Estado acerca do seu cumprimento constitucional e papel social. Ou seja, é necessário compreender a construção e aplicação das políticas públicas, tendo em vista as competências que a constituição federal determinou para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, e o que a lei elenca sobre as atribuições específicas para os Poderes Judiciário, Legislativo, Executivo, Ministério Público e Defensoria Pública. 

Desse modo, é necessário maior conscientização a respeito da comunicação dos crimes aos órgãos de segurança e de programas de proteção mais efetivos, os quais ofereçam estrutura adequada para proteção da mulher ameaçada para se afastar do ambiente de violência do qual vive. Visto que os programas que existem são limitados e de pouca duração, com reduzidos recursos e estrutura física limitada. 

O momento atual é de elevar as políticas públicas, uma vez que elas se complementam e quanto mais existirem e mais diversas forem, serão eficientes em razão de sua aplicação concomitante. Há necessidade de maior utilização das novas tecnologias na comunicação nas ocorrências de violência doméstica, com a massificação de dispositivos como tornozeleiras eletrônicas e controle via GPS da localização do agressor, assegurando-se por meio desses equipamentos a proteção à mulher e do necessário afastamento do agressor. 

Poder-se-ia, ainda, se utilizar mais corriqueiramente das tecnologias de aplicativos para se adotar sistemas facilitadores da comunicação das violências contra as mulheres, softwares que já existem e que se são muito pouco utilizados, apesar do baixo custo. 

A necessidade de proteção às vítimas da violência de gênero é urgente, uma vez que elas estão em situação de alto risco e vulnerabilidade social, sempre em busca de apoio e acolhimento nas portas das delegacias e órgãos afins.

Com isso, a discussão acerca da importância de fortalecer o discurso sobre as políticas públicas para as mulheres tem como premissa promover um novo padrão na ordem social de um país com altos índices de violência de gênero, como o Brasil, para que, assim, possamos construir uma sociedade destituída de preconceitos, relações de poder hierárquicas e heteronormatividade. 

Isso porque só a implementação de políticas públicas por si só não tem resolvido o problema da violência, visto que será necessária a atuação conjunta da sociedade, dos quatro entes federativos e suas entidades, por ser essa realidade um problema de todos.

Em pleno século XXI, não dá para continuar ignorando, ou tolerando, essa realidade da violência doméstica como crime de recorrência contumaz, sob o risco de se contribuir cada vez mais com a prática absurda, desumana, cruel, devastadora da dignidade e do bem-estar feminino.

Por isso ainda há luta das mulheres pelo o direito à própria sexualidade e de autonomia sobre o próprio corpo. Não conseguiremos avançar na redução da violência contra as mulheres, se não for realizado um maciço trabalho de educação nas crianças e jovens de hoje, para que amanhã possamos ter uma sociedade livre da ideologia de gênero. Quando se discute em trabalhar gênero nas escolas, é fomentar o respeito aos direitos humanos, respeito à diversidade, como forma de prevenção da violência contra as mulheres. 

Todavia, a escola não é a única responsável pela educação e é preciso avançar em estratégias e ações destinadas à reflexão da sociedade como um todo; sobre esses papéis, essas representações de gênero, sobre o que é ser feminino e masculino em uma sociedade tão patriarcal, em que a valorização do papel da mulher ainda é tão distinta, provocando, assim, a desigualdade. 

A partir disso, ao notar-se tais situações e o cenário atual, pode-se criar avanços individuais e coletivos, já que quando se nasce, introjeta-se esses valores e estereótipos de gênero. Por fim, afirma-se não só pela busca por igualdade, mas por equidade, em que o gênero não denota fragilidade e insuficiência, mas, sim, força e determinação. 

3.3 Violações institucionais e perspectivas de uma maior proteção à mulher

As delegacias especializadas no atendimento às mulheres precisam ser espalhadas e instaladas em todas as cidades, dado seu histórico de sucesso no acolhimento às vítimas, implementando, desde sua criação, práticas administrativas inovadoras, como escuta ativa das vítimas. 

É crucial entender que, no que pertine aos casos de delitos contra as mulheres, os policiais civis são os primeiros agentes públicos a terem contato com as vítimas em situação de violência doméstica. Nessa vertente, a adoção de estratégias direcionadas, que visem prevenir o risco produzido por processos feito por policiais com visões distorcidas e preconceituosas sobre o papel da mulher, tem direta relação para a prevenção de ocorrência de fatores que impossibilitem a compreensão do crime em que a mulher é vítima e na obtenção de um atendimento integral, cauteloso e que, muita das vezes, é a única oportunidade de solucionar o problema, sendo portanto, a chave para se obter respostas eficazes dos órgão de Justiça. 

Desse modo, é fundamental que saibam a diferença entre crimes que decorram do machismo e da desigualdade de gênero de outros tipos de delito, visto que há dificuldade na caracterização do aspecto violência contra mulher acerca de um contexto histórico-social e entender que existe desigualdade entre gêneros.

A questão ganha relevo se entendermos que a mulher vítima de seu companheiro, marido, filho, pai ou esposo, dentro do ambiente familiar, será violentada uma segunda vez quando procura os órgão estatais. Isso porque a vítima, frequentemente, se depara com um atendimento que a submete a nova violência, agora institucional, que se caracteriza pela omissão, negligência ou, principalmente, por imperícia, cuja responsabilidade é de quem pratica, em nome do Estado, um atendimento carregado de preconceitos e violações à dignidade da mulher. 

É nítido o juízo de valor – subjetivo, opinativo e preconceituoso – feito por profissionais no atendimento a mulheres nesse cenário de violência, sendo ineficiente esse trabalho de primeiro acolhimento, que costuma ser carregado valorações negativas acerca da vítima do sexo feminino. 

O tratamento chega a ser absurdo, principalmente quando, além do preconceito de gênero, sofre a mulher com o preconceito acerca de sua cor de pele, e aqui me refiro à mulher negra e também à mulher vítima de violência sexual, não estereotipada, com roupas curtas, solteira, e que é responsabilizada pela fúria do algoz. 

Nessa exposição pública, a par da vergonha, do constrangimento, conseguido que se supere a quase intransponível barreira da fala, submeter as mulheres a uma estrutura pública puramente fria e, por meio de violência institucional repetida, inverte a lógica entre a vítima e o algoz. Condena quem deveria ser acolhida e ouvida para o verdadeiro conhecimento das nuances das violências a que foi submetida. 

Quantas e quantas vezes são as palavras dessas mulheres vítimas colocadas como duvidosas, fazendo até com muitas desistam de noticiar o fato as autoridades? Desse modo, é visível que surgem ressalvas ao atendimento primevo policial e que mulheres se afastam das delegacias por não acreditarem na sua eficácia ou, simplesmente, para evitar contato com esses profissionais, pagos pelo poder público para solucionarem a violência e não para  institucionalizá-la. 

Assim é primordial a busca pela clareza entre instituições/equipamentos governamentais e não governamentais, possibilitando melhor qualidade de atendimento, identificação e encaminhamento, além de avanços em estratégias eficazes para a prevenção. 

É imprescindível a responsabilização dos profissionais que atuam com imperícia no sistema de Justiça brasileiro, assim como também é necessário estimular a capacitação dos agentes públicos, visto que muitos não estão devidamente preparados. É necessário que esses profissionais ofereçam atendimento mais humanizado às vítimas de violência doméstica e familiar e que possam perceber que a violência pode ser caracterizada como sutil ou óbvia, configurando-se quando se tem apenas um olhar de reprovação, cujas marcas trarão a chaga para uma vida inteira da vítima vulnerável. 

Não é meramente na esfera policial ou judicial que se pode combater esse problema social grave, dada sua origem cultural, como acontece com a violência doméstica e familiar contra a mulher. Dessa forma, cabe ao Estado, dentre outras ações, garantir a capacitação permanente dos profissionais que lidam com a atenção da vítima e aos agressores.

Outro problema é a falta de acompanhamento psicológico e a falta de equipamentos, materiais e profissionais qualificados para acolher a população vítima de violência. É fundamental que se estabeleça uma rede de serviços localizados em bairros, com o objetivo de facilitar o atendimento e o acolhimento dessas mulheres, considerando que, nos dias atuais, percorrem trajetórias distantes em busca de ajuda; com possibilidade de atendimento perto de sua residência, evitariam o deslocamento para lugares distantes.

Problemas físicos e estruturais, como a falta de espaço para atendimento humanizado; grande número de demandas e poucos unidades judiciais e núcleos; problemas quanto à falta de profissionais; atendimento feito por funcionários e estagiários sem preparo; falta de informação precisa e adequada; atrasos, cancelamentos não informados e faltas injustificadas; horários de atendimentos conflitantes com horário médio de trabalho das mulheres e dificuldade de cumprimento de medidas protetivas, em função do despreparo dos funcionários públicos colocados para a realização do atendimento as vítimas da violência. Esses são problemas recorrentes e podem ser facilmente resolvidos, sem grande custo para o poder público.

Ainda existem empecilhos institucionais ao acesso à justiça decorrentes de problemas históricos e culturais, como a conservação de um padrão patriarcal de culpar a própria vítima. Vale salientar o grau de dificuldade, quando nota-se que as mulheres vulneráveis buscam proteção ou reparação através desse sistema, que tradicionalmente foi pensado, construído, estruturado e ocupado por homens. 

As delegacias, tribunais e o legislativo são marcados pelas diferenças exacerbadas de gênero, invertendo a culpa do algoz para a vítima. O que se deve considerar é a realidade, que demonstra estar a mulher percorrendo uma trajetória de conquista lenta, mas que reclama avanços contínuos para eliminarmos os alarmantes casos de violações das vítimas quanto à sua saúde física, psíquica e até de suas vidas.

Por seu turno, os problemas políticos e legais são aqueles que se referem à escassez do trabalho em rede; à falta de visão da atividade judicante, do Ministério Público e da defensoria como integrada a um projeto maior de Política Pública; à ausência de capacitação qualitativamente condizente com este mesmo projeto; à legislação antiga, que não prevê algumas condutas típicas e compreende dispositivos legais conflituosos; à falta de implementação de condições para o cumprimento da Lei Maria da Penha na integralidade. 

A vulnerabilidade e resistência se entrelaçam, considerando que as vítimas fragilizadas pelo problema da violência precisam de suporte e de apoio adequado, tendo em vista que permanecem nesse cenário por opção. Nesse sentido, sobressalta-se a importância de punir, coibir e prevenir todas as formas de violência. 

A necessidade de enfrentar uma cultura da violência, rompendo com esse ciclo e a busca pelo empoderamento feminino é de suma importância, fazendo-se indispensável que as mulheres tenham uma vida mais tranquila, segura e, sobretudo, livre, ou seja, que se respeite em face da pessoa da mulher os direitos básicos de qualquer ser humano. 

4 O papel do Ministério Público no combate à violência doméstica

Atualmente, as políticas públicas figuram na ordem do dia nas discussões jurídico-sociais. Elas se apresentam como medidas jurídicas, administrativas, orçamentárias e financeiras, adotadas no plano governamental, e voltadas para a realização de direitos de conteúdo positivo, que exigem uma prestação por parte do Estado. 

Assim, são programas de ação governamental para coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, com vistas à realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados.

A expressão política pública, no dizer de Mancuso, pode ser entendida como conduta da Administração Pública voltada à consecução de programa ou meta previstos em norma constitucional ou legal – não um “fim em si”, mas a criação de um “mero instrumento” de governo, determinando obrigações a serem adimplidas, de condutas a serem implementadas – sujeita ao controle jurisdicional. 

O conceito de políticas públicas abrange vários componentes que devem ser levados em consideração: a) as competências dos órgãos e entidades na formulação, implementação e avaliação das políticas públicas; b) o arranjo institucional – eventual articulação envolvendo órgãos e entidades da administração pública federal, outros Poderes, outros entes da federação, estruturação de sistemas e definição de contrapartidas; c) o financiamento da política pública – recursos públicos finitos – opções; d) os mecanismos que viabilizem a participação popular – controle social do Estado – definição sobre quais são os atores; e) os segmentos da população elegíveis para cada política; f) os mecanismos de operacionalização; g) a avaliação, a realimentação e a eventual redefinição das políticas públicas. 

As políticas públicas demandam a atuação dos Poderes, do Ministério Público, e, cada vez mais, a participação social. Com efeito, o Poder Executivo é legitimado constitucionalmente a tomar a iniciativa de formular e implementar políticas públicas. 

Nesta senda, o Ministério Público tem sido canalizador de demandas, merecendo destaque seu papel de ouvidor dos anseios sociais, mormente dessas minorias da sociedade democrática, as quais não encontram voz em outros espaços de poder e de representação, tudo no intuito de pressionar o Poder Público, principalmente o Executivo, para a implementação de ações efetivas na defesa das mulheres vítimas de violência.

Nesse aspecto democrático de interlocução, cabe ao Ministério Público servir como ponte entre os anseios da sociedade e o estado, para que se articulem iniciativas múltiplas, revitalizando o envolvimento voluntário da comunidade ou de setores da sociedade civil, estabelecendo parcerias na gestão de políticas e programas sociais por meio de redes locais, nacionais ou mundiais e, por meio delas, constituir fóruns de escuta e localização de demandas, introduzindo-as na agenda política. 

Ótimos exemplos dessa conexão necessária de políticas públicas já adotadas e bem-sucedidas em vários locais do Brasil – quer sejam em municípios grandes, ou pequenos, médios, interioranos e capitais, políticas as quais podem ser incentivadas pelo Órgão Ministerial para adoção dos Executivos, dada, inclusive, a desnecessidade de alteração legislativa para tanto, vez que mero ato administrativo já convalida o cumprimento da política pública, dada a consecução lógica com os princípios da Lei Maria da Penha – é o estímulo à adoção de programas de aplicativos na defesa as vítimas e, por consequência, no eficiente rastreamento de seus agressores. É uma maneira barata e eficaz de controle das medidas protetivas de afastamento do agressor das vítimas da violência doméstica, método já adotado em muitos estados brasileiros, como já explorado anteriormente em outros momentos por nós. E a intersecção dessa tecnologia com atuação mais pontual das polícias militares e das guardas municipais, efetivos à disposição do policiamento ostensivo, tem se mostrado promissora de evitar situações de maior gravidade àquelas que continuam a sofrer com as ameaças de seus contumazes agressores.

5 Considerações finais

Ao longo da história, a violência contra a mulher se manteve por conta da construção de uma sociedade patriarcal e machista, considerando que a mulher sempre foi tratada como inferior, de modo geral, e submissa ao homem, exercendo o papel de cuidadora do ambiente familiar. 

Desse modo, por buscar seu lugar na sociedade surgem as lutas do movimento feminista, que ganham força a partir do século XX, com o objetivo de desconstruir paradigmas impostos pela humanidade. Ou seja, o feminismo não é sinônimo e nem antônimo de machismo, é, sim, um movimento político, cujo propósito é lutar pela libertação das mulheres e buscar igualdade nas relações sociais que vivenciamos. Afinal, as relações sociais são construídas sobre quatro pilares como relações de poder; divisão sexual e social do trabalho; controle do corpo das mulheres e a violência contra a mulher. 

No entanto, a partir de tantos acontecimentos envolvendo crimes contra as mulheres, têm-se a necessidade de combater à violência doméstica e familiar. Em pleno século XXI, após tantas mudanças e conquistas, como a lei Maria da Penha e lei 13.104/15 (lei do feminicídio), e apesar da produção de inúmeras políticas públicas de prevenção e conscientização, visando o combate da violência contra a mulher, ainda não se conseguiu, a contento, combater o mal das inúmeras violações às mulheres. Nessa vertente, o aumento de números de mulheres assassinadas fazem prova consistente de ainda estarmos diante de uma sociedade omissa ao flagelo feminino.

Um levantamento realizado em 2019 pelo Datafolha, encomendado pela ONG Fórum Brasileiro de Segurança Pública, identificou que, no período de um ano, 1,6 milhão foram espancadas ou sofreram tentativa de estrangulamento no país. 

Ainda de acordo com esse estudo, feito para avaliar o impacto da violência contra as mulheres no Brasil, 22 milhões de brasileiras passaram por algum tipo de assédio no período avaliado. E entre os casos de violência, 42% ocorreram no ambiente doméstico, sendo que 52% das vítimas não denunciou o agressor ou procuro ajuda. 

Já segundo o Atlas da Violência (2020) do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em 2018 houve 4.519 assassinatos de mulheres no país a cada duas horas, representando uma taxa de 4,3 homicídios para cada 100 mil habitantes. Já entre 2008 e 2018, sinalizou que 4,2% das mulheres foram assassinadas. 

Em 2018, 68% das mulheres assassinadas no Brasil eram negras, totalizando 3.005 assassinatos, representando a taxa de 12,4% de homicídios para cada 100 mil habitantes do sexo feminino. No entanto, entre 2008 e 2018, têm-se 36,1% das mulheres assassinadas. A tendência de crescimento manteve-se ano após ano, visto que em 2017 há dados que mostram que a taxa de mortes de mulheres bateu recorde, chegando a 4,7 assassinatos; e, em 2014 e 2017, chegando a 5,6 de mulheres negras a cada 100 mil habitantes. 

De modo geral, considerando todo o processo de evolução sobre o tema e seus resultados no ordenamento jurídico brasileiro, antes de repensar sobre certas definições que ao longo do tempo foram se naturalizando na sociedade, é preciso compreender como construímos nossa visão de mundo, os surgimentos de padrões de comportamentos, uma forma de pensar e agir que pode moldar uma sociedade por vários anos. Para entender os dados mencionados anteriormente é preciso, antes, começar a refletir sobre a origem do problema da violência contra mulher. 

Observa-se com os dados, que dispor apenas de legislações que criminalizam condutas ou adote incremento de sanções, não é suficiente, pois fica claro que mesmo após a promulgação da Lei Maria da Penha e da instituição do feminicídio como circunstância qualificadora do homicídio, os números só crescem. 

Em verdade, o que temos não é uma omissão legislativa e sim um problema de saúde pública, arraigado na forma como se construiu a cultura brasileira, de forte característica machista, visto que essa permanência da visão sexista de como se organiza a sociedade, o pilar básico de todo apoio para manutenção deste patriarcado, demonstrando que o problema tem dimensão social e pública e não se limita à criação de diplomas legais. 

As políticas públicas atualmente são ineficazes, considerando que para conseguir a contento o objetivo na diminuição da violência contra as mulheres é de extrema importância que o Estado invista na educação das crianças, com o intuito de se desenvolverem uma nova forma de pensar acerca do tema; além da necessária capacitação dos agentes públicos para atendimento adequado e eficaz, e investimento em políticas públicas eficazes, utilizando-se da mídia para conscientização da sociedade brasileira, provocando debates e, primordialmente, colocando o envolvimento dos homens nessa luta.

Sabe-se que a desigualdade de gênero é uma das violações dos direitos humanos mais persistentes de nosso tempo; desse modo, a jornada das políticas públicas pela igualdade de gênero tentará aproximar os homens deste tema, com o objetivo de mostrar que a igualdade de gênero é uma questão que afeta a todos e, portanto, é benéfica para sociedade, desconstruindo estereótipos prejudiciais que permanecem no cenário atual.

A educação e o acesso à informação são imprescindíveis para mudar o cenário da violência contra as mulheres. Os discursos acerca da imprescindibilidade ao respeito e do empoderamento feminino, em qualquer âmbito, precisam ser fortalecidos. 

Esta não é uma luta entre homens e mulheres, e sim uma luta da sociedade pelo desenvolvimento humano, não importando a que gênero se adequa ou se reconheça. Devendo-se desenvolver pensamentos não machistas no respeito às escolhas, com direito de viver livremente em uma sociedade, em que todos tenham voz ativa e que as decisões tenham impactos em suas próprias vidas. 

Levando-se em consideração a essencialidade do tema para a sociedade brasileira, enquanto não forem enfrentadas as principais causas das violações aos direitos das mulheres, a começar pela necessidade de se extirpar as práticas machistas do nosso cotidiano, dificilmente conseguiremos reduzir esse lamentável número de violações aos direitos das mulheres. 

Torna-se, portanto, obrigatórios os investimentos e as intensificações nas políticas públicas que visem garantir a prevenção e a proteção, de acordo com a realidade brasileira, potencializando uma transformação na cultura que elimine as desigualdades de gênero, para que nos possa conduzir a uma melhoria da eficiência nas políticas públicas de redução dos elevados números de mulheres violentadas. 

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